Defesa do ex-governador intensifica ofensiva enquanto STF revisa processos ligados à Lava Jato
A movimentação em torno da Operação Calicute, considerada o ponto de partida das acusações que levaram à prisão de Sérgio Cabral, voltou ao centro das articulações jurídicas. Com o Supremo Tribunal Federal (STF) ampliando as anulações de processos relacionados à Lava Jato, a defesa do ex-governador enxerga no ministro Gilmar Mendes a possibilidade de reverter o caso que inaugurou sua queda política.
Defesa leva novo dossiê a Gilmar Mendes
De acordo com reportagem do jornal O Estado de Minas, advogados de Cabral se reuniram na última semana com Gilmar Mendes para reforçar a solicitação de nulidade da Calicute. Eles alegam que os fatos investigados tiveram origem em supostos crimes eleitorais, ligados a doações da Andrade Gutierrez, o que, na visão da defesa, deveria ter transferido o processo à Justiça Eleitoral. Se essa tese prevalecer, todas as decisões tomadas pelo então juiz Marcelo Bretas ficariam comprometidas.
A estratégia inclui um elemento novo: documentos do processo disciplinar do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que resultou na aposentadoria compulsória de Bretas, em junho. Entre esses materiais aparecem mensagens trocadas entre o advogado Nythalmar Dias Ferreira Filho e o empresário Fernando Cavendish. Para a defesa de Cabral, esses diálogos enfraquecem o peso das acusações feitas por Cavendish, especialmente sobre a suposta participação do ex-governador na reforma do Maracanã.
Efeito dominó em outras ações
A delação de Cavendish — investigado na Operação Saqueador — permitiu que Bretas assumisse também a condução da Calicute e, posteriormente, dos desdobramentos da Lava Jato no Rio. Se o STF optar por anular não apenas a operação, mas também as delações homologadas pelo magistrado, outros processos envolvendo Cabral poderão seguir caminho semelhante, criando um efeito cascata em toda a estrutura de investigações no Estado.
Operação Calicute: o ponto de ruptura no Rio
Lançada em novembro de 2016 pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, a Operação Calicute provocou uma reviravolta no ambiente político fluminense. Parlamentares, empresários e operadores financeiros passaram a ser investigados por um grande esquema de corrupção alimentado por obras públicas e contratos bilionários.
Origem e impacto
O nome da operação faz referência a Calicute, cidade indiana que resistiu ao domínio português. Inicialmente, a investigação se concentrou em contratos ligados à construção da usina nuclear de Angra 3. Contudo, rapidamente vieram à tona irregularidades também na esfera do Executivo e do Legislativo do Rio de Janeiro, revelando a participação de altos agentes públicos na arrecadação ilegal de recursos.
A força-tarefa descreveu um sistema de propinas em que empreiteiras e empresários pagavam porcentagens fixas em troca de facilidades e contratos. Secretários, políticos e operadores ligados ao governo estadual apareciam no núcleo do esquema.
Cabral admitiu esquema de propinas
Em sua colaboração, Sérgio Cabral detalhou como funcionava o repasse dos valores:
“A tradição era de 10%, 20%, 30%”, declarou. “E aqui não quero me eximir, querendo ser bonzinho não, por cobrar 5%. Mas essa era a tradição do segmento.”
Segundo os investigadores, o dinheiro que deveria ser aplicado em Saúde, Educação e Transporte acabava financiando artigos de luxo, imóveis de alto padrão, automóveis caros, joias e viagens internacionais.
Um dos episódios mais emblemáticos associados ao período é a chamada “farra dos guardanapos”, registrada em Paris, símbolo da ostentação bancada por recursos desviados.