Ministério Público aponta rede criminosa que movimentou R$ 6 bilhões; vítimas relatam ameaças e fraudes
O Primeiro Comando da Capital (PCC) criou uma rede empresarial para lavar dinheiro do crime organizado em São Paulo, de acordo com investigações conduzidas pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) em parceria com a Receita Federal. O esquema, segundo os levantamentos, movimentou cerca de R$ 6 bilhões entre 2021 e 2025.
A engrenagem incluía 267 postos de combustíveis e 60 motéis, além de fintechs que recebiam transferências milionárias e centralizavam os recursos. Os valores eram posteriormente convertidos em bens de luxo para beneficiar integrantes da facção.
Pressão e intimidação contra empresários
Parte do dinheiro ilícito circulava por meio da compra forçada de estabelecimentos. Donos de postos afirmaram ter sido pressionados a vender seus negócios, muitas vezes sem receber o valor acordado.
Um deles contou ao Fantástico (TV Globo) que aceitou vender por necessidade financeira, mas, ao perceber o envolvimento de criminosos, tentou romper o contrato. A partir daí, passou a sofrer ameaças diretas.
“Ele começou a falar: ‘É, tem pai matando o filho por causa de dinheiro. Tem filho matando o pai por causa de dinheiro. Se mata muito fácil por causa de dinheiro’”, relatou a vítima.
Vítimas expostas a crimes da quadrilha
Segundo o promotor Sílvio Loubeh, após a venda fraudulenta, os estabelecimentos continuavam sendo usados pela organização criminosa, mas ainda em nome dos antigos donos. Com isso, os empresários enganados se tornavam réus em processos relacionados à venda de combustível adulterado e outras práticas ilícitas.
“Eles eram vítimas duas vezes: primeiro, porque não recebiam, e depois porque passavam a responder até pelos crimes cometidos pela organização”, afirmou Loubeh.
Fraudes em contratos e dívidas deixadas para trás
Outro caso envolveu um empresário obrigado a vender seu posto em 2018. Ele disse ter ouvido a ameaça: “Você vai vender o posto por bem ou por mal”. Sua assinatura foi falsificada em contratos e, hoje, ele ainda negocia com bancos para tentar quitar dívidas assumidas pela quadrilha.
Esse empresário identificou Alexandre Leal como comprador inicial do posto, que mais tarde teria repassado o negócio a Wilson Pereira Júnior, conhecido como Wilsinho. O Ministério Público o aponta como sócio de Flávio Silvério Siqueira, apontado como um dos principais beneficiários da operação.
Defesas negam ligação com facção
A defesa de Flávio Silvério Siqueira afirmou que ele “não tem contato com ninguém do PCC” e acrescentou: “O PCC mexe com crime e não com motéis ou qualquer outra empresa”.
Já o advogado de Wilson Pereira Júnior declarou que seu cliente “não foi formalmente citado no processo” e que prestará os devidos esclarecimentos às autoridades. A defesa de Alexandre Leal não foi localizada.
A fintech BK Bank, apontada como intermediária de recursos, negou participação no esquema e afirmou ser uma instituição regulada pelo Banco Central.
Impacto emocional e financeiro
As vítimas relatam que ainda sofrem com perdas materiais e psicológicas. Um empresário resumiu: “Perdi meu ganha-pão. E aí, a gente fica desesperado”. Outro acrescentou: “Eu sabia que ia dançar financeiramente, que não ia ter mais vida para nada. Mas pelo menos eu toco minha vida”.