Três medicamentos apresentaram níveis tóxicos de dietilenoglicol, substância letal associada a falência renal
A Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu um alerta internacional de segurança após a morte de dezenas de crianças na Índia provocada por xaropes contaminados com substâncias tóxicas. O comunicado, divulgado nesta semana, cita três medicamentos para tosse fabricados na Índia que apresentaram altas concentrações de dietilenoglicol (DEG) — composto químico usado em anticongelantes e altamente venenoso para consumo humano.
Segundo a OMS, as análises laboratoriais identificaram níveis acima do permitido da substância, que pode causar intoxicação grave, insuficiência renal aguda e morte, especialmente em crianças.
“O uso de medicamentos contaminados pode causar dor abdominal, vômitos, diarreia, incapacidade de urinar, dor de cabeça, alteração do estado mental e lesão renal aguda”, alertou a entidade em nota.
Produção suspensa e recall imediato
As autoridades estaduais indianas ordenaram a suspensão imediata da produção das farmacêuticas envolvidas e recolheram todos os lotes dos produtos contaminados. A licença de operação de pelo menos uma das fabricantes foi revogada, e investigações criminais foram abertas contra responsáveis técnicos e fiscais sanitários.
A OMS afirmou que nenhum dos medicamentos foi exportado oficialmente da Índia e que não há evidências de contrabando internacional. Ainda assim, a organização pediu que agências reguladoras de outros países intensifiquem o monitoramento, especialmente nas cadeias informais de suprimentos, onde medicamentos falsificados ou irregulares costumam circular sem controle.
Mortes e falência renal aguda
O governo do estado de Madhya Pradesh, no centro da Índia, confirmou pelo menos 19 mortes de crianças após o uso de um dos xaropes contaminados. O superintendente distrital Ajau Pandey, responsável pela investigação, relatou que as vítimas apresentaram sintomas leves no início — tosse e resfriado —, mas evoluíram rapidamente para falência renal aguda.
“No início, tinham tosse e resfriado; depois, sintomas de insuficiência renal que levaram à morte”, disse Pandey em coletiva de imprensa em 5 de outubro.
A polícia prendeu o proprietário da farmacêutica e afastou dois inspetores sanitários por negligência nas inspeções obrigatórias. Um médico que prescreveu o medicamento também é alvo de investigação.
Casos anteriores e histórico de contaminação
Não é a primeira vez que medicamentos indianos são associados a tragédias semelhantes.
- Em 2023, xaropes fabricados na Índia foram ligados à morte de dezenas de crianças no Uzbequistão e na Gâmbia.
- Em 2022, outro lote contaminado causou mais de 60 mortes infantis na Gâmbia e ao menos 20 na Indonésia.
Em todos os casos, a substância dietilenoglicol foi identificada como responsável pelas intoxicações fatais. O composto, usado indevidamente como solvente em alguns processos de fabricação, imita a aparência e o sabor do glicerol, um ingrediente comum em xaropes, o que dificulta a detecção em fábricas com controle de qualidade precário.
OMS pede rigor e rastreabilidade
A OMS orientou que as autoridades nacionais realizem auditorias em fábricas e laboratórios que produzem medicamentos líquidos orais, especialmente aqueles fabricados a partir de dezembro de 2024. A entidade também recomenda que países que importam produtos indianos reforcem a fiscalização e testem amostras antes da distribuição.
“Os medicamentos contaminados representam uma ameaça global e não devem ser tolerados. É essencial que todos os países verifiquem a autenticidade e a segurança de seus estoques”, alertou a OMS.
A Índia é atualmente o maior exportador mundial de medicamentos genéricos, respondendo por cerca de 20% da produção global. A recorrência de incidentes envolvendo contaminantes químicos tem pressionado o governo indiano a adotar medidas mais rígidas de controle sanitário e rastreabilidade industrial.