Advogados contestam pena de 27 anos e 3 meses imposta pelo STF e apontam falhas, contradições e irregularidades no processo
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro apresentou, nesta segunda-feira (27), um recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar anular a condenação de 27 anos e 3 meses de prisão imposta pela Primeira Turma da Corte por tentativa de golpe de Estado e outros quatro crimes.
No documento, os advogados afirmam que o julgamento foi marcado por “profundas injustiças”, além de omissões e contradições na análise das provas e no cálculo da pena. O objetivo, segundo a defesa, é que os ministros do STF reavaliem a decisão e corrijam “erros que, caso contrário, se tornariam definitivos”.
“O acórdão condenatório é, dada a máxima vênia, omisso quando traz afirmações sem apontar os elementos concretos que as sustentam”, argumenta o texto.
Os representantes do ex-presidente afirmam que Bolsonaro desistiu de seguir com qualquer tentativa de golpe e que, portanto, a condenação não encontra respaldo em fatos concretos.
Defesa alega cerceamento de defesa e falhas processuais
O recurso sustenta que a defesa não teve acesso completo e organizado às provas reunidas no processo. Segundo o texto, os arquivos digitais produzidos pela investigação teriam sido entregues de forma tardia e desordenada, o que teria dificultado a análise e impedido a verificação da origem e integridade das provas.
Os advogados afirmam também que não puderam acompanhar audiências de outros investigados do mesmo caso, ainda que todos sejam acusados de agir conjuntamente. A ausência, segundo eles, prejudicou a capacidade de contestar depoimentos e comprometeria o contraditório.
“Essa restrição retirou do ex-presidente a chance de contestar acusações que acabaram usadas contra ele”, pontua a petição.
Com base nesses pontos, a defesa afirma que o julgamento deve ser anulado integralmente, já que teria ocorrido em condições que violaram garantias fundamentais.
Pedido subsidiário: revisão da pena
Caso a anulação total da condenação não seja aceita, os advogados pedem uma revisão da pena aplicada, apontando irregularidades na dosimetria e no uso de agravantes repetidos.
A defesa argumenta que o acórdão contém omissões e contradições e que a pena foi artificialmente elevada, com base em fatores duplicados.
“O acórdão, dada a máxima vênia, esforça-se para colocar o embargante [Jair Bolsonaro] como uma figura onipresente nos fatos narrados sem, contudo, demonstrar ações concretas e as provas correspondentes. E, desta forma, repete fundamentos contraditórios, nos quais as premissas anunciadas e as conclusões alcançadas não encontram respaldo na prova trazida a título de fundamentação”, diz o texto.
Os advogados alegam que circunstâncias como a posição de liderança do ex-presidente e a suposta instrumentalização da máquina pública foram avaliadas duas vezes, tanto como fundamento geral da decisão quanto como agravantes específicas, o que teria aumentado de modo indevido a pena-base.
O recurso também solicita que o STF uniformize os percentuais aplicados nos aumentos e reduções da pena, já que, segundo a defesa, os índices variaram entre 16% e 100%, sem justificativas técnicas.
Uso da delação de Mauro Cid é questionado
Um dos principais argumentos da defesa é o uso, pela Primeira Turma, da delação premiada do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, apontada como inválida e contraditória.
Os advogados afirmam que o acordo de colaboração ainda está sob análise e que, portanto, não poderia ter sido usado como prova de condenação. Eles alegam que Cid mudou de versão várias vezes e teria mentido sob pressão, o que, segundo o texto, descredibiliza suas declarações.
“Muitos e diversos são os vícios que atingem a delação premiada do corréu Mauro Cid e os diversos depoimentos prestados pelo delator. Especialmente porque o delator, confessadamente pressionado, mentiu desde o início e seguiu mentindo, sem pudor”, afirma a defesa.
Contestação das acusações sobre o 8 de janeiro
Os advogados também classificam como contraditória a condenação de Bolsonaro por envolvimento nos atos de 8 de janeiro de 2023, alegando que ele foi tratado como responsável intelectual pelas invasões, o que, segundo a defesa, não é juridicamente coerente.
Eles argumentam que, como os autores materiais já foram julgados e condenados pelos crimes cometidos, não é possível punir Bolsonaro por autoria mediata.
“Se aquelas pessoas são responsáveis (e, de fato, o são), não é sequer coerente punir os réus desta ação penal por autoria mediata. Aliás, não é lógico ou juridicamente possível”, sustentam.
A defesa acrescenta que o ex-presidente não executou nenhuma ação concreta para tentar derrubar o resultado das eleições e que discussões sobre minutas e propostas nunca se transformaram em atos oficiais.
De acordo com o recurso, tais debates não configuram crime, pois se tratariam apenas de “ideias que não foram levadas a efeito”.
Os advogados dizem ainda que Bolsonaro teria desistido de qualquer iniciativa golpista e até desestimulado atos ilegais, o que, conforme o Código Penal, excluiria a punição por tentativa de crime.
Conclusão do recurso
A equipe jurídica pede ao Supremo que anule integralmente a condenação, com base nas supostas irregularidades processuais, ou, de forma alternativa, revise a pena aplicada, reduzindo-a de maneira significativa.
O documento afirma que o julgamento foi injusto, mal fundamentado e que o ex-presidente não recebeu tratamento equânime em relação a outros investigados.
O recurso ainda não tem data definida para julgamento, mas deve ser analisado pela Primeira Turma do STF, a mesma que aplicou a condenação original.