Decisão permite que ex-partido do ministro atue em ação sobre vaga no Tribunal de Contas do Maranhão, contrariando aliados e aumentando desconfianças
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) — legenda à qual foi filiado por mais de 15 anos — a ingressar como amicus curiae (amigo da Corte) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.780, que discute regras da Assembleia Legislativa do Maranhão (Alema) para a escolha de conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MA).
A decisão, datada de 4 de novembro, ocorre mesmo contra um pedido da Federação Brasil da Esperança (PT, PCdoB e PV), que havia se posicionado contra a atuação isolada do PCdoB. O movimento foi visto por parlamentares locais como uma “manobra protelatória” para manter o processo ativo no STF, já que os autores originais — o Partido Solidariedade — haviam perdido interesse na ação.
Nos bastidores da Assembleia Legislativa, aliados de Dino enxergam a medida como uma forma de preservar a influência política de seu grupo no controle de vagas estratégicas do TCE-MA.
Disputa por vaga e suspeita de favorecimento
A ação questiona dispositivos da Constituição estadual do Maranhão e do regimento interno da Alema que permitem votação secreta na escolha dos conselheiros. O Solidariedade argumenta que o método viola os princípios da transparência e da publicidade.
Com o aval de Dino, o PCdoB poderá apresentar manifestações e pareceres técnicos na ação, que tramita junto a outras duas ADIs (7603 e 7605), também relacionadas ao TCE-MA.
Fontes políticas no estado afirmam que o movimento beneficia diretamente aliados históricos de Dino, entre eles o ex-secretário de Saúde Carlos Lula (PSB), um dos nomes cotados para a vaga em disputa.
Decisão contraria federação partidária
A Federação Brasil da Esperança havia tentado barrar a atuação independente do PCdoB, alegando que partidos federados não podem agir isoladamente em processos judiciais. Dino, no entanto, rejeitou o argumento e afirmou que a Lei nº 14.208/2021 garante autonomia jurídica e política das siglas fora do contexto eleitoral.
“A federação unifica a atuação das legendas exclusivamente no âmbito eleitoral, preservando, contudo, a independência e a autonomia de cada partido quanto aos demais aspectos da vida partidária”, escreveu o ministro.
Controvérsia política e conexões pessoais
A decisão reacendeu críticas de opositores e juristas, que veem conflito de interesses na atuação do ministro em um processo diretamente ligado ao seu estado e a seu antigo partido.
O PCdoB do Maranhão é atualmente presidido pelo deputado federal Márcio Jerry, amigo pessoal e ex-padrinho de casamento de Dino. A esposa do ministro, Daniela Farias de Araújo Lima, trabalha desde 2022 como secretária parlamentar no gabinete de Jerry, segundo registros da Câmara dos Deputados.
Além disso, a esposa do deputado, Joslene Rodrigues, chefiou o gabinete de Dino quando ele foi governador do Maranhão — laços que reforçam a percepção de proximidade política e pessoal entre as partes envolvidas.
“Pedalada judicial” mantém disputa viva
Deputados estaduais Carlos Lula (PSB) e Othelino Neto (Solidariedade), aliados do grupo político de Dino, têm defendido publicamente que a ação permaneça em tramitação, mesmo após o recuo do partido autor.
Para críticos, a entrada do PCdoB no processo representa uma “pedalada judicial” — uma tentativa de prolongar artificialmente uma ação que deveria ter sido arquivada por perda de objeto.
“A decisão mantém viva uma disputa que favorece aliados diretos do ministro no Maranhão. É difícil não enxergar motivação política”, avaliou um parlamentar da oposição local.
O ministro, por meio de sua assessoria, negou qualquer interferência política e afirmou que atua exclusivamente dentro dos autos:
“É impossível manifestar-se sobre gravações de origem desconhecida. As manifestações do ministro Flávio Dino ocorrem apenas nos processos, como manda a lei.”